sábado, abril 23, 2016

Carta do Achamento do Brasil exibida em Belmonte

Em Portugal, é a primeira vez que a Carta de Pêro Vaz de Caminha, "a certidão de nascimento do Brasil", é exposta fora de Lisboa
Hoje, pelas 10.00 da manhã, a carta que Pêro Vaz de Caminha escreveu a D. Manuel I, dando conta da "nova do achamento desta vossa terra nova", vai sair da Torre do Tombo, em Lisboa, para pela primeira vez em Portugal ser exposta fora da capital. A partir de terça-feira, dia 26 de abril, e durante seis meses, vai ser a estrela maior da exposição O Novo Mundo e a Palavra, que vai ocupar uma das salas da torre de menagem do Castelo de Belmonte, na Beira Baixa.
É um daqueles documentos com o qual todos os portugueses já se cruzaram na disciplina de História, o primeiro testemunho da existência de um Novo Mundo, uma terra povoada de gente "de bons corpos, pardos, maneira d"avermelhados". Não admira, portanto, que esta carta, de 28 páginas escritas pelo punho de Pêro Vaz de Caminha, e datada de 1 de maio de 1500, raramente saia da caixa-forte do Arquivo Nacional Torre do Tombo.
Num papel de trapos feito, este primeiro relato de uma realidade que mudou verdadeiramente a face da terra, foi incluído pela UNESCO no Registo da Memória do Mundo, em 2005. Exatamente cinco anos depois de, em 2000, ter voltado a atravessar o Atlântico, regressando à Terra de Vera Cruz para assinalar os 500 anos do "achamento" que relata. A nau comandada por Gaspar de Lemos ficou dispensada desse retorno, envolto em todo o cuidado. Na ocasião foi transportada numa mala especial e acompanhada de muito perto por Luís Sá, conservador da Torre do Tombo, que hoje voltará a ser o guardião do documento, um dos 18,5 milhões do arquivo já disponibilizados na internet.
"É uma mala que tem isolamento térmico e é antichoque, com espuma. Para além disso tem uma capinha, ligeiramente alcalina, em que vai envolvida [a carta] e, finalmente, tem duas camadas de um material, que tem na sua composição sílica-gel, que faz a estabilização se houver alguma oscilação. A mala consegue garantir [as condições ideias de conservação durante] cerca de 48 horas", explica Luís Sá.
Tempo mais do que suficiente para chegar a Belmonte, na Beira Baixa, conduzida por um dos motoristas da câmara local, de quem partiu a iniciativa de realizar esta exposição. O porquê foi ontem prontamente avançado pelo presidente da autarquia: "Belmonte é a terra de Pedro Álvares Cabral, o capitão-mor da armada em que Pêro Vaz de Caminha participou." O objetivo é claro: chamar mais visitantes ao concelho que lidera. "Calculamos que recebemos cerca de 65 mil visitantes por ano e, com esta iniciativa, pretendemos chegar aos cem mil", quantifica António Rocha, durante a apresentação da exposição, ontem, na Torre do Tombo, onde até um chefe Patachó, de Porto Seguro, local onde a armada de Álvares Cabral desembarcou, marcou presença. Tal como os primeiros homens descritos por Pêro Vaz de Caminha, trazia "uma maneira de cabeleira de penas d"ave".
Condições especiais
À espera do documento, um dos quatro à guarda da Torre do Tombo que fazem parte do Registo da Memória do Mundo da Unesco, está uma renovada sala da torre de menagem. Uma temperatura entre os 18 e os 22 graus e níveis de humidade entre os 45% e os 55% são duas das maiores exigências para a exibição do documento, identificadas por Silvestre Lacerda, diretor da Torre do Tombo. Além do mais, "foi construída uma vitrina específica para poder receber a carta, permanentemente monitorizada e vigiada", explicou o responsável do arquivo nacional. Os dados são recebidos na Torre do Tombo e verificados para caso haja alguma alteração substancial ser logo feita uma intervenção.
Filomena Marques, da empresa desafiada para pôr de pé esta exposição, explica outras intervenções feitas na sala da torre de menagem do castelo que tem pouco mais de 30 m2. "Todo o espaço onde a carta será exibida foi forrado com uma espuma própria de forma a proteger da luz e da humidade", concretiza. Mas há mais: "As janelas existentes foram anuladas da sua função original e optámos por as utilizar como ponto de informação. Assim, controlamos em absoluto as condições do ar."
"O espaço está dividido em duas partes. A primeira área, a que se acede a partir do terraço de pedra do Castelo de Belmonte, é ilustrada com imagens multimédia que remetem para o imaginário medieval e dos bestiários, em três planos sobrepostos - que se distinguem sucessivamente graças ao uso de diferentes luzes, um recurso expositivo criado em parceria com o ateliê Carnovsky e utilizado pela primeira vez em Portugal", explica Filomena Marques.
Numa zona mais restrita, onde estará a tal vitrina especial, com a Carta de Pêro Vaz de Caminha, "privilegia-se a descrição e a palavra, sendo o documento contextualizado através de peças dos séculos XV e XVI cedidas pelo Palácio Nacional de Sintra (azulejos), Casa--Museu Medeiros e Almeida (uma pintura representando Nossa Senhora do Leite, do Mestre da Lourinhã) e Museu Nacional de Arte Antiga (uma Virgem com o Menino, esculpida na oficina de João Afonso). Em fundo, vozes dos alunos da Escola de Música de Belmonte leem excertos da Carta.
Com entrada gratuita para a população local, a exposição é inaugurada na terça-feira, dia 26 de abril, exatamente 516 anos depois de ter sido rezada a primeira missa no Novo Mundo.

In Diário de Notícias online, 22/04/2016

quarta-feira, abril 06, 2016

Beira Baixa em antigas imagens


 Este site divulga imagens de postais antigos da BEIRA BAIXA. Nesta página, e no blog que aqui são apresentados, pode encontrar postais de muitas das terras da região.
Visite :
https://www.facebook.com/BeiraBaixaAntigasImagens/

segunda-feira, abril 04, 2016

ADUFEIRAS DA BEIRA BAIXA EM SELOS DE 1985

MARAFONAS

A marafona é uma boneca feita à mão na aldeia de Monsanto e em Penha Garcia e ainda noutras aldeolas junto à raia, na Beira Baixa.
Serve hoje para que as velhinhas que lá moram consigam amealhar umas moedas extra no final do mês, vindas de bolsos turísticos. Mas o seu significado é milenar, e desconcertante.
Há duas crenças locais acerca dos poderes destas bonecas: uma primeira, que faz delas amuletos protectores contra tempestades, e uma segunda, enquanto objecto supersticioso para dar boa fortuna às mulheres no momento de engravidarem.
Por partes.
Falando primeiro do uso da marafona como pára-raios, podemos ir até às Festas de Santa Cruz, nas quais as mulheres, acompanhadas destes brinquedos, sobem ao monte santo, enquanto os abanam. A marafona, quando agitada à subida para o topo da colina de Monsanto, ganha poderes pouco prováveis, como este de afastar as trovoadas. Mas além disto, e mantendo-me ainda nesta utilidade de resguardar atribuída a tal boneca, a marafona é usada em Penha Garcia enquanto protectora de bebés e crianças. Colocam-se à janela marafonas de tamanho maior, e em número igual ao número de crianças que vive na casa, servindo elas assim de anjos da guarda dos mais gaiatos. Antes, era também frequente colocarem-se junto ao gado, para o proteger do mau olhado.
E indo agora ao segundo significado, também se faz dela um amuleto para a fecundidade. Segundo a tradição, a marafona é colocada debaixo da cama dos casais (especialmente na noite de casamento), e tendo em conta que é surda (não tem ouvidos), cega (não tem olhos) e muda (não tem boca), nada pode contar a ninguém. Fica assim ligada a cultos antigos e de raiz claramente pagã, como uma transcendente impulsionadora da fertilidade, causa tão comum em determinados objectos tidos popularmente como poderosos, como acontece, por exemplo, com as pedras parideiras, perto de Arouca.
A ligação delas à aldeia de Monsanto é tão umbilical que, segundo a lenda, deve-se a elas uma vitória contra um poderoso inimigo (dependendo da versão, seria mouro ou castelhano) que sitiava o castelo. Reza a história que os poucos aldeões que se encontravam dentro de muralhas puseram marafonas a dançar alegremente, fingindo passá-las por mulheres de verdade. As tropas invasoras, ao vê-las indiferentes à sua débil posição, desmoralizaram tanto que abandonaram o cerco.
Quanto à sua anatomia, é, por dentro, uma cruz em madeira, onde se enrola um pedaço redondo de lã que forma a cabeça, trajada depois, em pano, com cores e padrões ao gosto de quem as faz. O facto de ser uma cruz remete-nos novamente para o carácter sagrado do objecto.
Numa visita a Monsanto, que vale sempre a pena, lembrem-se delas.

In http://www.portugalnummapa.com/marafona/